Estudo revela danos sofridos por mulheres na região 3 do Paraopeba

Publicado em: 30 de março de 2022


Reportagem e foto: Bárbara Ferreira – Nacab
Edição de texto: Brígida AlvimNacab

Sobrecarga de trabalho doméstico e cuidados com a família; cansaço e problemas de saúde mental e física; insegurança alimentar e nutricional; maior exposição à violência; perda de renda e de autonomia. Esses são alguns dos danos levantados pela pesquisa que ouviu mulheres atingidas pelo rompimento da barragem da Vale, na região 3 da Bacia do Paraopeba. O estudo foi realizado pela Assessoria Técnica Independente (ATI) Paraopeba Nacab em parceria com a consultoria Saberes Populares, entre novembro e dezembro de 2021.  

Por meio de oficinas, rodas de conversa e entrevistas foi possível construir com as mulheres, e a partir delas, o retrato dos danos sofridos pelas famílias atingidas e também ampliar a compreensão sobre o que é ser mulher atingida e a luta por direitos. A análise dos dados desta pesquisa vai colaborar com a construção da Matriz de Danos para indenização compensatória da Vale, com foco na justa reparação para as atingidas e suas famílias. 

Foto: Bárbara Ferreira – Nacab

Apresentação de resultados

Na última quinta-feira, 24 de março, a equipe técnica do Nacab e da consultoria Saberes realizou uma reunião virtual para expor resultados do estudo e um panorama sobre os danos levantados. Participaram mulheres e homens das comunidades atingidas. 

“A gente vive essa luta em relação a nossos direitos, que é uma coisa que jamais imaginávamos que precisaríamos lutar. O desastre ambiental, o desastre da vida, contaminação do Rio Paraopeba. Nós, estamos nos acabando, morrendo a cada dia em relação a tudo isso que aconteceu com a natureza. A gente vai se destruindo emocionalmente, financeiramente. A gente não sabe o que nos aguarda”.

Silvéria Baeçada comunidade de Vista Alegre, Esmeraldas, relatou durante a reunião

Outras mulheres relataram dificuldades com abastecimento de água, perdas na produção, acesso a alimentos, aumento da poeira e acúmulo de lama dentro de casa, sobrecarga de trabalho e emocional, entre outras mudanças ocasionadas pelo rompimento da barragem e a contaminação do rio Paraopeba.  

Na ocasião, foi citado o uso da Caderneta Agroecológica, metodologia proposta nas oficinas para que as mulheres possam controlar sua produção agrícola e calcular as perdas. A caderneta considera inclusive o que é produzido para consumo, trocas e outras formas de comercialização. “Achei muito legal, porque para a gente que é autônoma é difícil contabilizar o nosso trabalho. Mas agora, com essa caderneta anoto tudo e consigo acompanhar, comparar e até planejar”, conta Tatiane Campolina, da comunidade de Cachoeirinha, em Esmeraldas. 

Participação das mulheres

A pesquisa utilizou metodologias participativas para levantamento e sistematização de danos vivenciados pelas mulheres. Foram realizadas oficinas com grupos de atingidas nos territórios. As dinâmicas promoveram espaços de falas, resgates de memórias e o registro dos saberes populares e tradicionais das mulheres atingidas, para levantar perdas que são específicas delas e de suas comunidades.

“Como, por exemplo, precificar uma terra de raiz, que vem da ancestralidade, que faz parte da identidade de um povo? São questões profundas que a gente precisa enfrentar e trazer como prioridade. As entrevistas, conversas e instrumentos utilizados na pesquisa nos possibilitaram levantar essas falas e depoimentos de saberes guardados pelas mulheres”.

Laetícia Jalilprofessora e pesquisadora da Saberes Populares

A consultoria também fez entrevistas com mulheres atuantes no poder público de alguns municípios e atividades internas com integrantes da ATI Nacab.

Ao todo, foram 20 entrevistas com mulheres atingidas; sete oficinas nas comunidades, com um total de 89 participantes; entrevistas com cinco gestoras locais e a junção de dados secundários (coletados por outros pesquisadores, institutos ou por governos) dos municípios da região 3.

No saldo, o levantamento indica como as mulheres sofrem de formas específicas, e muitas vezes acentuadas, as consequências do desastre-crime ocorrido em janeiro de 2019. 

Continuidade

Tanto na pesquisa quanto em outras atividades que a ATI Paraopeba realiza com grupos de mulheres atingidas, há pedidos de continuidade no trabalho com as mulheres do território. Sobre essa demanda, a assessora de mulheres e juventude da ATI Paraopeba Nacab, Ângela Oliveira, afirmou que já estão previstas nas ações da Assessoria Técnica Independente a realização de mais oficinas e encontros com mulheres ao longo deste ano.

“Estamos preparando encontros para refletir temas de interesse na reparação e trocar experiências entre as mulheres. É fundamental dialogar com elas, para que se apropriem de informações sobre seus direitos, se fortaleçam, denunciem as violações e discutam estratégias para conquista de direitos não reconhecidos”.

Ângela Oliveira – assessora de mulheres e juventude da ATI Paraopeba